Sobre o legado
Como o Garantia se tornou uma lenda e perpetuou uma cultura de empresa no mercado brasileiro
Diz-se que certa vez um figurão do mercado financeiro (admirado por muitos, por mim inclusive) precisou montar uma equipe para tocar uma área completamente nova em sua empresa. Muitas pessoas nessa equipe eram muito jovens, com pouca experiência mas muita obstinação. Estes raríssimos selecionados estavam deslumbrados com a ideia de trabalhar para um de seus ídolos, um verdadeiro titã na história do mercado de capitais brasileiro. Este homem, vendo como a equipe recém-contratada tinha um ar que beirava a arrogância, desmontou a armadilha de ego que esse grupo se encontrava e disse: “eu já fui igual a vocês. Eu também já fui um f*dido de classe média que quer contar uma história”.
Se essa história procede ou não, eu não sei. Mas muitos de nós nos identificamos com essa descrição. Alguns nem tanto com a “classe média” (alguns de nós tivemos mais facilidades que outros, pudemos pagar uma boa educação particular, intercâmbios, capacitação técnica, alguns luxos e tantas outras coisas), mas muitos certamente querem contar uma história. Deixar um legado. Algo que fique aqui depois que os vermes roerem a carne dos nossos ossos debaixo da terra.
le.ga.do
do latim legatum, algo que foi deixado em testamento.
Não sei de todos, mas um dos meus maiores medos é passar uma vida inteira sem ter construído nada. Isso sempre foi estimulado no meu núcleo familiar. Meu pai e minha mãe sempre me incentivaram a seguir com meus projetos - ainda que nem todos eu tenha concluído - para de fato construir algo que pudesse ser meu, que eu tivesse feito e de que eu pudesse me orgulhar. Acredito que isso move as pessoas que vivem com propósito, ainda que esse legado não seja necessariamente uma empresa, mas um patrimônio, uma família, ou mesmo uma rede de pessoas que você consiga impactar de alguma forma.
Feita essa breve introdução, queria falar um pouco sobre um fenômeno extremamente interessante que percebi desde que comecei minha carreira nesse mercado, que é a verdadeira disseminação de uma cultura de uma empresa que fez história no Brasil - uma cultura de empresa que deixou um legado.
Se você trabalha no mercado financeiro, certamente já ouviu falar do Banco Garantia. “Sonho Grande” (um excelente livro, caso você não tenha lido) é o favorito e recomendado de muitos e muitos profissionais do mercado e influenciadores. Mas tão interessante quanto a história do banco é conhecer sua cultura, seus pilares centrais.
Se uma empresa é constituída de pessoas que estão unidas em prol de um mesmo benefício através de uma relação contratual, compreendê-las, saber suas qualidades e defeitos e especialmente saber a semelhança entre todas as partes desse todo é essencial. Qual é, verdadeiramente, a cultura daquela empresa? Que tipo de pessoa tem mais sinergia com aquele ambiente de trabalho? Ou, como diz o primeiro princípio do Garantia, qual o “Sonho Grande e Desafiador” que faz todas aquelas pessoas remarem numa mesma direção?
E a verdade, caros, é que o Garantia não morreu em 98. Ele está em todo lugar. Está nas corretoras, nas gestoras, nos bancos de investimento, nas casas de research. Talvez não tanto no que era o “dia a dia” da empresa, mas com certeza no modelo de negócios. Sua cultura se perpetua mesmo décadas após o fim do banco. Esse é o verdadeiro legado.
A História do Banco Garantia
Em 1971, Jorge Paulo, juntamente a Luiz Cezar Fernandes e Ramos da Silva, desejavam abrir sua própria corretora. Sem dinheiro e com a ajuda de Guilherme Arinos Franco e Adolfo Gentil, compraram a patente da Corretora Garantia. No mesmo ano, Marcel Telles foi contratado e, no ano seguinte, Beto Sicupira, que conheceu Jorge Paulo praticando pesca submarina, começou a trabalhar na companhia.
Em 1981/82, os sócios do Garantia (Lemann, Telles e Sicupira) expandiram seus negócios e adquiriram as Lojas Americanas. No mesmo ano, Luiz Cezar Fernandes deixa o Garantia para se unir a outros dois sócios para fundar o Banco Pactual (parte do que era conhecido, naquela época, como o IGPM dos bancos de investimentos no Brasil: Icatu, Garantia, Pactual e Matrix).
Em 1989, o Garantia compra a Brahma, o embrião do que viraria posteriormente o maior conglomerado de cervejas do planeta, por US$90 milhões. No ano seguinte, a sede do Garantia foi transferida para São Paulo.
Em 1994, o banco teve um lucro de quase US$1bi. No entanto, com os efeitos da crise asiática, e, posteriormente, a crise financeira russa, o banco perdeu uma quantidade substancial de dinheiro, especialmente em repurchase agreements de C-bonds. Pensamento de longo prazo e controle de risco não faziam parte do vocabulário do Garantia. Com a virada do mercado, o banco precisava vender C-bonds para honrar os compromissos com clientes e pagar o spread entre o preço acordado nos repos e a marcação dos C-bonds a mercado, o que trouxe ao banco um prejuízo de aproximadamente 500 milhões de dólares. Muitos investidores sacaram suas economias dos bancos e o patrimônio dos fundos administrados pelo banco caiu pela metade. Daquele dia em diante, soube-se que os profissionais do Garantia não eram invencíveis.
Finalmente, em 1998, o Banco Garantia foi vendido ao Credit Suisse por um pouco mais de US$1 bilhão.
Sobre a cultura do Banco Garantia
No Sonho Grande, a Cristiane Correa deixa alguns dos princípios que eram pilares centrais na gestão do banco, que acho uma síntese excelente da mensagem que o livro quer passar. São eles:
Um sonho grande e desafiador faz todo mundo remar na mesma direção.
O maior ativo da empresa é gente boa, trabalhando em equipe, crescendo na medida de seu talento e sendo recompensada por isso. A remuneração tem que estar alinhada com os interesses dos donos.
O lucro é o que atrai investidores, gente boa e oportunidades, mantendo a máquina rodando.
Foco é essencial. Não dá para ser ótimo em tudo. É preciso concentrar-se no essencial.
Tudo tem que ter um dono, com responsabilidade e autoridade. O debate é bom, mas, no final, alguém tem que decidir.
O bom senso é tão bom quanto grandes conhecimentos. O simples é melhor que o complicado.
Transparência e fluxo de informações facilitam decisões e minimizam conflitos.
Escolher gente melhor do que si mesmo, treiná-las, desafiá-las e mantê-las é a principal tarefa dos administradores.
A liderança por exemplo pessoal é vital, tanto nas atitudes heroicas como nos pequenos gestos do dia-a- dia.
Sorte é sempre resultado de suor. Tem que trabalhar muito, mas com alegria.
As coisas acontecem na operação e no mercado. Tem que gastar sola de sapato.
Ser paranóico com custos e despesas, que são as únicas variáveis sob nosso controle, ajuda a garantir a sobrevivência no longo prazo.
A insatisfação permanente, a urgência e a complacência zero garantem a vantagem competitiva duradoura.
A inovação que agrega valor é útil, mas copiar o que já funciona bem é normalmente mais prático.
A discrição corporativa e pessoal só ajuda. Aparecer, só com objetivo concreto.
Aperfeiçoamento, melhora e educação são esforços constantes e devem integrar nossa rotina.
Nome, reputação e marcas são ativos valiosíssimos que se constroem em décadas e se perdem em dias.
Malandragens e espertezas destroem uma empresa por dentro. A ética compensa no longo prazo.
Partnership, a busca incessante por “gente boa” e a mentalidade imediatista está, em minha opinião, por todos os lugares da Faria Lima.
Tive a oportunidade e o privilégio de entrevistar algumas pessoas que trabalharam no Garantia para entender um pouco melhor o dia a dia na empresa, a cultura, e tentar entender o que tem em comum em todas essas pessoas que fizeram parte de uma instituição lendária no nosso mercado de capitais. Por motivo de compliance e para a privacidade dos entrevistados, vou utilizar iniciais fictícias.
CS: Um dos axiomas que acho que são mais conhecidos do modelo de gestão do Banco Garantia é o tal do “gente boa, trabalhando em equipe, com um sonho grande”. O que seria “gente boa”? Quem era o funcionário médio do Garantia? O que ele cursava? Onde ele estudou? Quais skills ele tinha?
T: (risos) O tal do “gente boa”… O Jorge Paulo falava muito isso. O funcionário médio do Garantia queria fazer dinheiro a qualquer custo. Não interessa onde ele estudou, não interessa onde ele trabalhou. Tinha que estar ali e querer ganhar dinheiro.
L: O funcionário médio do Garantia tinha feito economia, administração, alguma engenharia. Não necessariamente era tier 1, eu fiz UERJ por exemplo. Mas com certeza tinha que ter muita vontade de ganhar dinheiro
J: Acho que as pessoas pensam que pra ser um profissional do banco tinha que ter uma formação tier 1, fazer MIT, Harvard. Não é bem assim. Até tinha quem tivesse estudado em Harvard ou em Londres. Mas esses caras eram os que sofriam mais dentro do banco, porque a vida pra eles foi mais fácil. Um cara desse não tinha sangue nos olhos...
CS: Era o tal inteligentinho… (risos)
J: Não tinha espaço para esses caras lá. O Garantia era um banco de resultados. O cara que é muito inteligente, nerd, quer muito provar o próprio ponto, quer muito mostrar que está certo. Lá a gente queria alguém para agir, não para provar um ponto. Provar ponto não dá dinheiro. Agir dá.
F: Não existia isso de medir esforço pelo tempo que você passa no trabalho. Não interessa se você foi o primeiro a chegar e o último a sair. Interessa no fim das contas se você ganhou dinheiro.
CS: O funcionário Garantia então precisava agir acima de qualquer coisa?
T: Precisava ter muita vontade de ganhar dinheiro.
J: Devia muitas vezes agir, depois pensar. Era um jogo de transpiração, não inspiração. A gente queria a ação. O que você pensa não interessa. Era muito mais um jogo de inteligência emocional.
L: Seu currículo é um meio para você conseguir sua entrevista. Mais importante que seu QI é seu QE. Sua capacidade de aguentar pressão. Isso é o que a gente mais procurava.
J: Todo mundo no Garantia era muito esforçado. Tinha muita gente muito inteligente, mas absolutamente todo mundo era muito esforçado.
CS: Tinha sangue nos olhos, né?
J: Sangue nos olhos, perfeito. E saber jogar no fairplay. Tudo bem você ser competitivo. Todo mundo no banco era muito competitivo. Mas tem que ser honesto e jogar de maneira justa.
CS: A gente sabe que uma sociedade é igual a um casamento…
T: ô… (risos)
CS: E que é muito importante você ter um sócio que pense de uma maneira diferente de você e tenha habilidades diferentes das suas. Quais você acha que eram as principais qualidades do Lemann, do Sicupira e do Telles que colaboraram, por muitos anos, pro sucesso do Garantia?
J: O Jorge Paulo era monossilábico. Na realidade, tanto ele quanto o Marcel falavam muito pouco. Mas quando o Jorge Paulo falava, todo mundo parava pra ouvir. Ele criou uma seita. Criou toda a cultura do Garantia. Quem estava lá amava aquilo ali. Quem não estava, queria fazer parte. Ele é verdadeiramente um líder.
F: O Jorge teve o dom de inspirar pessoas. Nosso business é feito de gente, não é feito de Bloomberg, de robô, nada disso. É feito de gente. Poder inspirar pessoas é um grande diferencial. Ele é um gênio de contratar gente boa, ele entende de pessoas, e por isso também é um ótimo salesguy.
L: O Marcel para mim foi o verdadeiro estrategista do Garantia. Ele conseguiu implementar a cultura que o Jorge Paulo criou para um banco de 300 pessoas num conglomerado de 60 mil. Tinha uma capacidade de execução espetacular. O Beto era o cara da ação. Agir era sempre com ele. Ele era um cara esquentado, mas era o cara do “missão dada é missão cumprida”. Tudo que colocassem no guarda-chuva dele, ele fazia e fazia bem feito.
CS: Foi mencionada a questão da inteligência emocional e saber aguentar pressão. A gente sempre ouve falar muito dos trotes do Garantia. Você acha que isso ajudou de alguma forma, positiva ou negativamente, na cultura do banco?
T: Era comum nas entrevistas a gente xingar as pessoas no processo seletivo. Não por nada, mas pra saber se o cara aguentava pressão. Se ele esboçasse incômodo, não servia pro serviço. É polêmico, mas buscar gente que tem sangue frio foi o que fez o banco ter US$1 bilhão de lucro.
L: Todo fevereiro e agosto saíam 10% dos funcionários do banco. Todo fevereiro e agosto. Isso também orientava todo mundo a ser obcecado por resultado: se você está nos últimos 10%, você tá fora. Isso ajudava na “governança pelo medo”, mas também fazia com que aumentasse o nível e a competitividade do banco.
CS: 10% de turnover em quantas pessoas?
L: 300. Sempre 300. 300 era nosso número mágico no Garantia. Mais pro final obviamente precisamos expandir. Mas por muito tempo eram sempre 300.
CS: E por que você acha que as pessoas queriam fazer parte do Garantia, mesmo com os trotes e com a rotatividade alta? É pela cultura?
L: Pelo dinheiro. Sempre pelo dinheiro. Nada a ver com cultura. Na época tinha quatro bancos de investimento que eram de elite: Icatu, Garantia, Matrix e Pactual. Qualquer um deles era o céu.
T: O Garantia ainda era melhor porque pagava 5, 10 vezes mais no bônus que os outros.
CS: Mas poder ser sócio do banco era um diferencial de cultura… (risos)
L: Era. (risos)
F: O Jorge Paulo conseguiu juntar muita gente muito boa com um incentivo que não existia na época. Não existia isso de você ser sócio do banco, receber participação. Lá tinha um lema muito importante: a gente ganha junto ou a gente perde junto. Não existe só uma área receber bônus porque performou bem. Se o banco não tem lucro, não tem bônus e acabou. Não interessa se sua área bateu a meta. Tá todo mundo junto. A gente ganha junto e a gente perde junto.
CS: Qual você acha que foi o maior legado do Garantia? Algo que você vê que hoje se tornou comum em outras instituições do mercado?
J: Acho que a ideia de trading floor. Não existia isso no Brasil antes do Garantia. Também a informalidade. Não era normal ver gente do mercado usando qualquer coisa que não fosse terno. Sempre azul, branco, preto. Hoje em dia não é mais assim. Partnership também. A possibilidade de virar sócio de onde você trabalha, se você se dedicar bastante. Isso também não tinha.
F: No Garantia, antes de ir pra mesa, você tinha que ir pro backoffice. Não existe começar operando. Todo mundo que entrava no banco e queria operar começava como liquidante, pra depois ir pra mesa. Hoje isso em institucional é muito comum, mas antes não existia.
CS: Não existia?
F: Não… E você disse que a cultura do Garantia existe hoje, eu discordo. O Garantia foi um banco circunscrito no tempo. Era outro mercado, outro país, outros valores. O Brasil estava explodindo em inflação. O banco era fruto de um país completamente diferente. Talvez tenha importado o apreço por gente boa, a ideia de partnership, mas nunca a cultura do Garantia. Talvez o Garantia não sobrevivesse ao politicamente correto, o ESG, tudo isso que existe hoje em dia, que não é pior nem melhor, mas é uma outra sociedade.
CS: Você lembra como foi seu processo seletivo ou algum processo que você conduziu para recrutar pessoas dentro do banco?
J: Eu tinha um amigo que trabalhava no banco e me chamou pra uma reunião. Achei que era pra fechar algum negócio específico, não me contratar. Mesmo porque eu tinha minha própria empresa. Não tinha muito isso de banco de investimentos no Brasil. Meu amigo me dizia, “vem trabalhar aqui, você vai fazer muito dinheiro”. Eu dava risada. Aí entraram na sala o Jorge Paulo e mais dois sócios. Eu era um rapaz muito arrogante. Falei que não fazia sentido pra mim trabalhar lá. O Antônio (Freitas Valle) me perguntou porquê. Eu disse “eu posso te dar dez motivos pra não trabalhar aqui. Primeiro, nunca vi ninguém com conta nesse banco. Nunca vi cartão, cheque com nome de vocês.”. Deram risada, óbvio. Pra você ver o tamanho da minha ignorância. Nem sabia o que era um banco de investimentos. “Segundo, Banco Garantia? Que merda de nome é esse?” O Jorge Paulo gargalhou. “Terceiro, vocês estão me dizendo que são banqueiros e usando calça jeans? Eu tenho cara de palhaço?”. E fui falando, falando… Uns dias depois fui pra casa da minha namorada na época e conversei com o meu sogro, era executivo da empresa X na época. Falei que uns caras do tal Banco Garantia queriam me contratar. Ele ficou atônito e falou: “você conheceu o Jorge Paulo?” e eu respondi “é, acho que ele mesmo”. Me respondeu: “então você tá me dizendo que querem te contratar pra trabalhar pro Jorge Paulo e você não quer ir pra tocar sua empresinha?”. Eu tentei argumentar, não sabia quem era o Jorge Paulo, falei “ah, mas veja bem…”. Ele me respondeu: "J. Se o Jorge Paulo te chama pra trabalhar com ele, você larga tudo. Você larga a porra toda e você vai.”. No fim, foi o melhor conselho que eu poderia receber.
F: A gente tinha um lema para contratar as pessoas para trabalhar com a gente: se a gente se encantar com o perfil do cara, ele não pode sair do prédio. Eu não posso correr o risco de ele fazer outra entrevista amanhã, receber uma proposta melhor e ir pra concorrência. Eu vou fazer uma proposta, a pessoa vai me dar fechado e vai começar na segunda-feira.
CS: Qual foi a maior lição profissional que o Garantia te ensinou?
T: Aprendi com um erro nosso. O Garantia era um banco de trading, isso passou pra cultura. A gente não focava em ter relação de longo prazo com o cliente. A gente cultivou e cativou poucos clientes. Acho que isso de uma maneira ou de outra acabou impactando pro fim que teve. A cultura imediatista, curto-prazista do banco prejudicou muito a gente.
F: O foco do Garantia era ganhar dinheiro para o Garantia. Não era administrar, não era fazer deal pra cliente.
J: Uma lição que aprendi é a marcação a mercado. Um ativo vale o quanto você está disposto a pagar. Mas a marcação a mercado é atualizada todos os dias. Isso tem a ver com a vida. Num dia você dá uma porrada fazendo um trade. Aquele dia você fez uma coisa inteligente. No dia seguinte vale zero. Você está zerado. O trade de ontem foi ontem. Todo dia você acorda zerado, porque nossas decisões são dinâmicas. Você está à mercado todos os dias. Não quero saber qual é meu “preço médio”. O que passou, passou. Quero saber hoje e daqui em diante.
CS: É demais isso. Mas parece um exercício muito difícil não se deixar levar pelo ego quando você ganha tanto dinheiro…
J: É muito difícil. Mas o que é gente boa?
CS: … quem traz resultado?
J: Gente boa é quem faz coisa boa. Simples assim. Mas pra ser consistentemente gente boa, tem que fazer coisa boa todo santo dia porque você acorda zerado todos os dias.
CS: F., qual sua maior lição trabalhando com o Jorge Paulo?
F: A minha lição foi que o networking é tudo nesse mercado. Além de ter criado uma cultura voltada pros incentivos, o Jorge Paulo era extremamente bem relacionado dentro e fora do Brasil. Quando o Jorge comprou as Americanas, o Sam Walton buscou ele no aeroporto pra entender o modelo de negócio. Isso não só porque ele é bem relacionado, mas porque ele nunca teve medo. Ele nunca pensou “ah, vou incomodar o Walton, qual a chance de ele me ajudar”. Ele só ligava. A gente não pode ter medo de levar não… Por fim, pra trabalhar comigo, eu prefiro um cara que eu precise segurar do que um que eu precise empurrar. Melhor trabalhar com um louco, porque a pessoa que eu preciso empurrar, eu simplesmente vou mandar embora. A gente sempre dava pras pessoas muita autonomia e responsabilidade, o que no fim era sempre melhor.
Fato é que, se um negócio é feito por pessoas, os incentivos são primordiais para a prosperidade daquela empresa. Nas palavras de Munger, “me mostre os incentivos, e lhe mostro os resultados”. O Garantia mostrou bem como bons incentivos levaram a excelentes resultados. É só pesquisar como estão a maior parte das pessoas que saíram do banco hoje. Muitos fundaram ou participaram de outras grandes instituições do mercado, sejam assets renomadas, seja trabalhando no BC, seja em outros bancos.
Definitivamente, ainda que uma parte dos entrevistados não concorde com a perpetuação do legado do Garantia, eu consigo ver muito dos pilares do banco em cada um deles: todos são pessoas inteligentes e obstinadas, obcecadas por resultados, que foram recompensadas por isso e que prosperaram em suas carreiras.
Os incentivos estavam ali. Os resultados, todos sabemos.
Vários anos depois, ouve-se falar pouco do Banco Icatu e do Matrix. O Garantia, quase 25 anos depois, ainda é muitíssimo comentado não só pela sua história mas pelo seu modelo de gestão. Muitos dos que admiram a história do banco, como eu, nem o viram atuando.
E o Banco Pactual? Bom… Com sorte, consigo algumas pessoas pra contar essa história em breve também!
Obrigada por ler!