Jim Simons no padrão de sketches do Compounders (nada mais justo, afinal, para o fundador de um fundo cujo rendimento bruto médio é de 65% ao ano desde 1989, ‘compounder’ mais parece um reducionismo do ofício).
Meus doces, bom dia.
Nesta sexta-feira, 10/05/24, faleceu Jim Simons, fundador da Renaissance Technologies e mente por trás do fundo Medallion. O motivo de prestar a homenagem, muitos dos leitores da news já devem saber. Mas caso não se tenha dimensão, elucido com essa tabela do estudo da Cornell Capital:
O retorno astronômico do fundo Medallion é, como de fato dito no estudo, o maior contra-exemplo da hipótese dos mercados eficientes. Como um estatístico cujo fundo trabalhava com arbitragens, a missão de Simons era clara: se aproveitar das assimetrias do mercado para buscar alfa e fazer dinheiro. Rios dele.
No meio dos anos 2000, Jim Simons chamou atenção da mídia nos Estados Unidos, não só por se tornar o gestor de hedge fund mais rico - ele era, possivelmente, um dos mais inteligentes.
Matemático e acadêmico, Simons já era conhecido pela Teoria Chern-Simons (algo envolvendo geometria diferencial que, como exercício de humildade intelectual, eu li algumas vezes mas não faço a menor ideia do que se trata, então não vou tentar explicar. risos) e por ganhar o prêmio Oswald Veblen, extremamente prestigiado no campo da geometria.
Simons começou a carreira no mercado tradando commodities, mas, como matemático, sempre ficou encantado com a ideia de uma máquina que trabalhasse para fazer dinheiro para ele - estamos falando aqui da década de 70. Juntou diversas mentes brilhantes - não os street smart de Wall St.; os book smarts, de universidades de matemática, especialistas em criptografia e em comunicação militar. Nasce o fundo Medallion, cujos nomes foram dados pelos prêmios acadêmicos conquistados por Jim Simons e James Ax.
Mestre do que conhecemos como quantitative investing, Simons se aproveitava de assimetrias no mercado para conseguir retornos. Muitos outros fundos, hoje, seguem este mesmo modelo de investimento - nenhum, no entanto, chegou minimamente perto dos retornos do Medallion. Segue abaixo o apêndice 1 do livro The Man Who Solved The Market, com os retornos do fundo:
Um dos homens mais ricos da indústria nos Estados Unidos, Simons também dedicou grande parte dos seus recursos à filantropia - não por acaso, à pesquisa em matemática e ciências em universidades.
Meu propósito com essa news, no entanto, não é contar a vocês a história do Jim Simons - mesmo porque conheço a qualificação da base de e-mail da minha newsletter o suficiente para saber que a maioria de vocês sabe, seguramente, com mais propriedade que eu. Caso interesse, no livro “The Man Who Solved the Market”, de Gregory Zuckerman, conseguimos aprofundar um pouco mais sobre a história de Simons, da Renaissance e do Medallion, a estrela da gestora.
“A maneira como consegui ter sucesso foi me cercar de ótimas pessoas.”
Como bem-dito no livro More Money Than God, sobre a indústria de hedge funds nos Estados Unidos, uma personalidade como Jim Simons jamais teria sobrevivido a uma carreira de bancos. Uma estrutura burocrática não comportaria uma mente como a dele, naturalmente um contrarian: foi demitido do centro de code-cracking do Pentágono por denunciar seus chefes e algumas das políticas acerca do conflito do Vietnam. (Diz-se, inclusive, que trabalhar numa instituição tão hierarquizada e organizada como o Pentágono deu a Simons a possibilidade de compreender a importância da cultura de empresa, tornando a Renaissance blindada por fora e extremamente unida por dentro. Além de um brilhante matemático, Simons foi um empreendedor visionário.)
Em entrevista a David Rubenstein (fundador do Carlyle Group) no livro How to Invest, Simons trata, justamente, de um diálogo em que Simons mostra seu lado empresário, que é o que eu queria destacar nessa news.
DR: E em algum momento você decidiu abrir uma empresa de investimentos chamada Renaissance?
JS: […] criamos o Medallion Fund […]. Era administrado por um sujeito chamado Jim Ax, e tudo deu certo por cerca de seis meses, mas depois ele começou a perder dinheiro demais. Falei, “preciso entender o sistema que você está usando”. Ele respondeu: “é complicado demais.”
O que percebi é que ele estava fazendo trend following. Anos atrás, seguir tendências em commodities teria sido ótimo, mas as pessoas perceberam que existem tendências em commodities e também no câmbio. Então todo mundo estava mergulhando nisso, e não estava dando certo. Insisti que parasse. Ele não quis. Um cara chamado Henry Laufer, que era ótimo e tinha descoberto um sistema de curto prazo que Ax não estava usando, voltou a trabalhar para mim. Juntos, criamos um bom sistema, um sistema de fast trading.
DR: Não sou um cara da matemática1, mas entendo o que você fez. Sua ideia era ver como, digamos, ações ou outras coisas estavam funcionando e procurar anomalias no mercado. Se houvesse uma anomalia, você poderia tirar vantagem daquela transação antes que ela não fosse mais uma anomalia. Em outras palavras, você vê uma ineficiência. Você negocia contra ela e, quando ela se torna eficiente, você sai da operação?
JS: Isso. Às vezes, essas anomalias duram muito tempo. Às vezes nunca desaparecem. São todas pequenas, mas dá para juntar um monte de anomalias e é maravilhoso.
[…]
DR: Se você pudesse dar um conselho a alguém sobre como ser um grande investidor, o que diria? Especializar-se em alguma coisa, saber o que está fazendo ou rezar para ter sorte? O que diria que é necessário para ser um grande investidor?
JS: É preciso um pouco de sorte. Tenho dado palestras com frequência e, de vez em quando, uso o título “Matemática, bom senso e boa sorte”.
DR: Essas são as coisas principais?
JS: A maneira como de fato tive sucesso foi me cercar de ótimas pessoas. Gosto de recrutar. Ainda gosto disso. com o Medallion Fund, eu me cerquei das pessoas mais inteligentes que consegui encontrar.
DR: Você não tem medo de contratar alguém que considera mais inteligente que você?
JS: Se alguém for mais inteligente que eu, melhor ainda. Tenho certeza de que temos algumas pessoas que pelo menos acham que são mais inteligentes que eu, e provavelmente são, mesmo. Meu segredo para o sucesso é encontrar boas pessoas.
O Medallion é já há alguns anos fechado e 100% do capital é de funcionários. O motivo para isso é um tanto simples: um fundo que trada a curto prazo tem uma questão importante de capacity, além de precisar se preocupar - e muito - com a resiliência e pulverização do seu passivo para questões de position sizing (liquidez e cotização, além da concentração de passivo, limitariam o tamanho das posições).
Isso gera um paradoxo curioso na indústria de investimentos: um dos hedge funds mais extraordinários não está acessível para investidores comuns.
Pense na analogia do More Money Than God: O Medallion é um carro de Fórmula 1 que a indústria automobilística - talvez, quem sabe um dia - poderia emular. As pessoas não podiam comprar este carro de Fórmula 1 - mas a possibilidade de alguém criar algo parecido fez com que as pessoas comprassem automóveis.
Em outras palavras: a simples existência do extraordinário Medallion criou um efeito borboleta na indústria de hedge funds, fazendo cair por terra a falácia de que fundos quantitativos são ineficientes - algo que ficou estigmatizado depois da derrocada da famosa LTCM.
Esse é o poder e o legado de Jim Simons.
Descanse em paz.
Obrigada, como sempre, por ler.
Clara Sodré
David Rubenstein é advogado de formação
E mais, Clara... A morte do Jim Simons... Com tudo que um falecimento de alguém estrelado assim incentiva que se escreva a respeito... Nos faz lembrar do tanto de gente que hoje se intitula quant mas não dá nem pro cheiro...
E, como Rubestein, não precisa ser matemático para perceber