Meus doces, bom dia.
Dizem que a ganância e o medo são dois poderosos motores para a tomada de nossas decisões. Se isso é fato, a história do Banco Master, desde sua fundação até ontem, parece ser a epítome do que estes sentimentos podem gerar no nosso mercado.
O Banco surge (com este nome) em 2017, depois do antecessor Máxima quase quebrar com a alta inadimplência no seu segmento de crédito imobiliário. O Banco Máxima era um tanto concentrado no segmento imobiliário e aprendeu ‘na marra’ um velho ditame de mercado: a importância da diversificação.
O Master chama a atenção do mercado já há alguns anos por seus resultados surpreendentes: o autointitulado banco de investimentos (que, na prática, opera mais como um merchant bank) saiu dos 200 milhões de patrimônio líquido em 2019 (um ‘pequeno tamborete’, como dizem os antigos deste mercado) para o grande feito de expressivos 5 bilhões de reais.
Grandes feitos exigem grandes desafios.
E grandes desafios exigem grandes… riscos.
Em algumas corretoras, até pouco tempo, os CDBs do Banco Master eram ofertados a uma média de 120 a 130% do CDI - algo expressivamente acima dos 90 a 100% negociados na média do mercado.
Esta rentabilidade atrativa fez com que ouvíssemos por aí: “não tem segredo, CDB do Banco Master, o FGC cobre, qualquer coisa”. Sim, sabemos que não deveríamos investir pensando na cobertura do fundo. Mas, como eu já disse,é um gatilho de ganância, que motiva nossas ações. Com essa narrativa, os CDBs do Master inundaram o mercado e captaram rios de dinheiro.
A contraponta?
Diz um gestor para matéria da Revista Piauí que uma parte considerável é investida em ativos… estressados (Oi, Gafisa e Ambipar, para dizer alguns nomes). Empresas que podem, claro, eventualmente voltar a dar lucratividade e portanto um retorno estrondoso - ganância - , mas uma estratégia um tanto arrojada para alguns de nós - aqui se sobressai o medo.
Estas empresas, segundo porta-vozes do banco, são investidas com objetivo de reestruturação. Entram neste rol, ainda, Westwing, Aliança e Light, muitas destas empresas feitas em parceria com o empresário Nelson Tanure, que já é um velho conhecido neste mercado. Na Gafisa, a Esh Capital trava um embate com o empresário, acusando-o de lesar a empresa para seu benefício - lesando, em última instância, o acionista.
A matéria da revista expõe ainda um fato interessante: parte do controle do banco pertence à holding financeira Banvox, holding que o fundo Estocolmo (que não havia sido mencionado até então) detém uma quantidade cavalar de debêntures conversíveis. Fundo este pertencente a… Nelson Tanure.
Esta estória do mercado, recentemente materializada em artigo na Revista Piauí, virou uma pauta extensivamente debatida na Faria Lima, pois ressuscitou a pauta da liquidez do banco. Volta, aqui, o medo.
Ao final da matéria (muitíssimo bem redigida), o diretor-presidente do FGC diz: “A turma do mercado precisa entrar no modo de reflexão de como manter a saúde do sistema. Porque esse mecanismo de proteção ajuda a perpetuar o desenvolvimento econômico. Se alguém acha que determinada instituição está investindo em coisas com risco demais, então é preciso rever as regras do jogo”
Mais recentemente, saiu uma matéria, já desmentida, alegando que a Ágora deixaria de negociar CDBs do Banco Master, visando reavaliar o risco. Vemos, de novo, o medo.
E vemos, como sempre, os sentimentos se materializando em narrativas (falsas ou não) e as narrativas se materializando em fluxo.
Numa coisa, Vorcaro foi irretocável: o medo é saudável para mensuração de risco.
E o recente burburinho sobre este banco parece ter suscitado duas questões que até então pareciam adormecidas:
A primeira, o quanto estes dois sentimentos inflam e ruem fluxos de capital e empresas - e são retroalimentados por notícias, fofocas, estórias de almoços com celulares desligados e tantas outras coisas.
A segunda, até onde a ganância cega a mensuração de risco.
Dizer que sabemos o que acontecerá daqui para a frente é mera presunção, mas certamente ainda ouviremos falar muito sobre o banco neste mercado.
Se você leu a newsletter do Banco Garantia (a maioria de vocês chegou aqui por ela e até hoje é o post mais visitado), viu um clássico conto de um banco muito agressivo que teve uma derrocada um tanto improvável e infeliz.
Se você conhece a história da regulamentação das instituições financeiras depois da crise subprime, viu histórias de bancos gigantescos com metas arrojadas sendo adquiridos, liquidados ou reduzidos a… ‘tamboretes’.
O conto da ganância e do medo no mercado financeiro é uma fábula recente, mas ao mesmo tempo muito, muito antiga.
E vocês sabem como são as narrativas.
Nem sempre se repetem, mas volta e meia rimam.
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Clara Sodré
Parabéns pelo texto!!!
Excelente texto, Clara!